TUDO ACEITA E NADA MERECE

sexta-feira, 8 de junho de 2007

D. CARLINHOS I

Tinha acabado de sair da Litografia onde exercia com mestria o seu munus. Vá lá saber-se como, a feijoada do almoço ainda continuava bem presente em frequentes assomos ameaçadores de ventosidades, portadoras daquele perfume a enxofre, metano e ovos podres que tanto prazer olfactivo proporcionam a quem os lança. Hesitou. Talvez ainda fosse possível chegar a casa, ao fim e ao cabo, quase ao virar da esquina. Não, era melhor não arriscar. Estugando o passo, uma vez que a monstruosa calda fervente ameaçava a todo o momento, qual vulcão estromboliano, rebentar a ténue protecção entrefólhica, encaminhou-se para a sua bem conhecida porta, procurando, sem se afastar um milímetro do percurso, um recanto mais escondido que lhe pudesse proporcionar uma alternativa, caso a cólica final chegasse mais rapidamente que o previsto. Felizmente conseguiu acercar-se da abençoada entrada. Imaginemos a tortura daqueles segundos, aparentemente diminutos mas um verdadeiro tormento, enquanto o raio da chave fazia tentativas para abrir o obstáculo final. No tempo em que a movimentação ritmada das passadas controlou a ira dos deuses da defecação a coisa foi andando. Uma vez imóvel, frente à horrível barreira, que teimava em resistir às voltas da chave milagrosa, as forças tremendas do magma merdolento ressurgiram num frémito verdadeiramente avassalador. Felizmente o monstro cedeu. Sem perder um segundo acelerou rumo à casa de banho, procurando, ao mesmo tempo, desfazer-se das calças e das cuecas. Aí chegado, sem sequer acender a luz, naquela penumbra de fim de tarde que entrava pela minúscula janela, pode, finalmente, excrementar e – oh céus – o prazer, a volúpia, o sétimo-céu, enquanto a massa fumegante se escapava roncante umas vezes, apenas sussurrante outras, deixando um vazio cada vez maior naquelas sofredoras tripas. Limpando um pouco o suor frio que se tinha apossado da testa, olhou em volta. Os olhos, até então semi-cerrados de gozo, começaram a habituar-se à pouca luz ambiente. Aí, surpresa das surpresas, exclamou ao vislumbrar o formato da outra louça sanitária que fazia par com aquela onde estava refastelado: “Tem piada, não me lembrava que esta cagadeira tinha duas sanitas…”
Com a pressa, sem acender a luz, tinha-se aliviado no bidé.
Carlinhos, contada por ti era simplesmente divinal.

1 comentário:

escória-porco disse...

Uma correcção:

"em frequentes assomos ameaçadores de ventosidades, A QUE CHAMAVA VIÚVAS, portadoras daquele perfume a enxofre, metano e ovos podres"

O seu a seu dono.